segunda-feira, 25 de abril de 2011

PARA MULHERES EXEMPLARES

Sempre se lembre que
a pele enruga,
o cabelo se torna branco,
os dias se transformam
em anos...
mas o importante não muda:
Tua força e tua esperança
não tem idade,
teu espírito é o espanador
de qualquer teia de aranha.
Atrás de cada linha de
chegada,
há uma de partida.
Atrás de cada engano,
outro desafio.

Enquanto estiver viva,
sinta-se viva.
Se fizer algo diferente,
volte a faze-lo.
Não viva de fotos amareladas.
Segue em frente
ainda que todos esperem
que desista.
Não deixe que se oxide o
ferro que existe em ti.

Faz que, em vez de pena,
Tenham respeito por ti.
Quando, devido à idade
não puder correr, ande depressa.
Quando não puder
andar depressa,
caminhe.
Quando não puder caminhar,
use bengala,
mas não pare nunca!!!


Camille Claudel.
escultora francesa / 1864-1943







sábado, 26 de março de 2011

A revolução feminista no Oriente Médio

 Publicado originalmente Carta Maior , em 12/03/2011

 O papel das mulheres no grande levante do Oriente Médio tem sido muito pouco analisado. As mulheres do Egito não só “se somam” aos protestos, mas tem sido uma força destacada da evolução cultural que as tornou indispensáveis. E o que vale para o caso do Egito, pode se dizer também, em maior ou menor medida, para todo o mundo árabe. Quando as mulheres mudam, tudo muda; e as mulheres do mundo muçulmano estão mudando radicalmente. O artigo é de Naomi Wolf.

Naomi Wolf - Al Jazeera

Entre os estereótipos dos países muçulmanos mais habituais no Ocidente encontram-se os relativos às mulheres muçulmanas: crédulas, cobertas com véus, submissas, exóticas e caladas, integrantes de haréns imaginários e encerradas em papéis de gênero muito rígidos. E então, onde estavam essas mulheres na Tunísia e no Egito.

Em ambos os países as manifestantes não se pareciam absolutamente com esse estereótipo ocidental: estava na primeira linha da luta e no centro, nas imagens das notícias e nos fóruns do Facebook, inclusive assumindo a liderança. Na praça Tahrir, no Egito, mulheres acompanhadas, algumas acompanhadas de crianças, trabalhavam sem descanso para apoiar os protestos, contribuindo em atividades de segurança, comunicações ou abrigo. Muitos comentaristas atribuíam o grande número de mulheres e crianças ao caráter pacífico dos manifestantes em geral diante de graves provocações.

Outros repórteres-cidadãos da Praça Tahrir – e praticamente qualquer um que tivesse um telefonema celular poderia sê-lo – assinalavam que as massas de mulheres implicadas nos protestos eram muito diversas do ponto de vista demográfico. Muitas levavam lenços na cabeça e outros sinais de conservadorismo religioso, enquanto outras se deleitavam com a liberdade de beijar um amigo ou fumar um cigarro em público.

Participantes, líderes
Mas as mulheres não só atuavam como trabalhadoras de apoio, o papel habitual a que ficam relegadas nos movimentos de protesto, desde os da década de 1960 até os recentes distúrbios estudantis no Reino Unido. As mulheres egípcias também organizavam, formulavam estratégias e informavam dos acontecimentos. Autoras de blogs como Leil Zahra Mortada assumiram graves riscos para manter o mundo informado diariamente sobre a situação na praça Tahrir e outros lugares.

O papel das mulheres no grande levante do Oriente Médio tem sido muito pouco analisado. As mulheres do Egito não só “se somam” aos protestos, mas tem sido uma força destacada da evolução cultural que as tornou indispensáveis. E o que vale para o caso do Egito, pode se dizer também, em maior ou menor medida, para todo o mundo árabe. Quando as mulheres mudam, tudo muda; e as mulheres do mundo muçulmano estão mudando radicalmente.

A transformação mais importante é educativa. Há duas gerações, somente uma reduzida minoria das filhas da elite recebia formação universitária. Hoje, as mulheres representam mais da metade do número de estudantes nas universidades egípcias. Elas estão se formando para exercer o poder de um modo que suas avós mal poderia imaginar: publicar jornais, como fez Sanaa el Seif desafiando um decreto governamental que exigia a interrupção da atividade; aspirando postos de liderança estudantil; arrecadando fundos para organizações de estudantes ou dirigindo reuniões.

De fato, uma minoria substancial de mulheres jovens do Egito e de outros países árabes passaram seus anos de formação refletindo criticamente em contextos mistos e questionando em público inclusive a professores homens nas aulas. É muito mais fácil tiranizar uma população quando a metade tem uma péssima educação e é trinada para a submissão. Mas, como os ocidentais deveriam saber por sua própria experiência histórica, quando se educa as mulheres é provável que agitação democrática acompanhe a transformação cultural generalizada que se produz.

A natureza dos meios de comunicação social também contribuiu para converter as mulheres em líderes do protesto. Por ter me dedicado durante mais de uma década a ensinar técnicas de liderança para mulheres, sei o quanto difícil é conseguir que se coloquem em pé e tomem a palavra em uma estrutura organizativa hierárquica. Deste modo, as mulheres costumam evitar a figura padrão que, no passado, os protestos tradicionais impuseram a determinados ativistas: quase sempre, a de um jovem exaltado com um megafone na mão.

Projeção de poder
Em semelhantes contextos – um cenário, um foco e um porta-voz – as mulheres evitam os papéis de liderança. Mas os meios de comunicação social, pela própria natureza da tecnologia, modificaram o aspecto e a aparência da liderança atual. O Facebook imita o modo pelo qual muitas mulheres preferem viver a realidade social, onde as relações entre as pessoas são tão importantes quanto o predomínio ou o controle individual, se não mais.

Pode-se ser um líder poderoso no Facebook justamente forjando uma “primeira pessoa do plural” realmente fabulosa. Ou pode-se conservar o mesmo tamanho, conceitualmente, que qualquer outra pessoa em sua página; não é necessário reafirmar o domínio ou a autoridade. A estrutura da interface do Facebook cria o que – em que pese 30 anos de pressão feminista – as instituições de cimento e tijolo não conseguiram gerar: um contexto no qual a capacidade das mulheres para forjar um “nós” poderoso e envolver-se na liderança a serviço dos demais possa promover a causa da liberdade e da justiça em todo o mundo.

Logicamente, o Facebook não pode reduzir os riscos dos protestos. Mas, por mais violento que possa ser o futuro no Oriente Médio, o registro histórico do que ocorre quando as mulheres que receberam educação participam de movimentos libertadores faz pensar que chegou ao fim a era daqueles que gostariam de manter um regime de punho de ferro na região.

Quando a França iniciou sua revolução em 1789, Mary Wollstonecraft, que foi testemunha inesperada dela, escreveu seu manifesto em favor da libertação das mulheres. Depois que as mulheres norte-americanas, que tinham recebido educação, contribuíram para a luta pela abolição da escravidão, elas introduziram na agenda o sufrágio feminino. Depois que disseram na década de 1960 que a “única posição para as mulheres é a horizontal”, criaram o feminismo de “segunda geração”: um movimento nascido das novas habilidades e das velhas frustrações das mulheres.

Uma e outra vez, quando as mulheres travaram as demais batalhas de seu tempo pela liberdade, passaram a defender seus próprios direitos. E como o feminismo é uma prolongação lógica da democracia, os déspotas do Oriente Médio enfrentam uma situação na qual será quase impossível obrigar a estas mulheres que despertaram a deter a luta pela liberdade, a sua própria luta e a de suas comunidades.

(*) Naomi Wolf é ativista política e crítica social; seu livro mais recente é “Give Me Liberty: A Handbook for American Revolutionaries”.

Tradução: Katarina Peixoto

sábado, 12 de março de 2011

Sem as mulheres, não há revolução

Publicado na Agência Carta Maior , em  09/03/2011.



Agora, com as revoluções árabes, volta à tona a participação das mulheres nas revoluções. Nós também queremos igualdade, liberdade e não temos medo. Durante uma revolta social nossa participação é fundamental para que os avanços não fiquem só no plano formal e para que haja um questionamento profundo dos papeis atribuídos às mulheres e uma ruptura dos mesmos. Contamos com vários exemplos históricos nos quais temos visto que, quando as mulheres participam nas revoluções, a luta lado a lado com nossos companheiros de classe faz crescer a consciência. O artigo é de Angie Gago.

Angie Gago – Em Luta (Espanha)

Este mês volta a celebrar-se um novo 8 de março, Dia Internacional da Mulher Trabalhadora. Durante esta jornada de protesto, milhões de mulheres em todo o mundo sairão às ruas para reivindicar seus direitos. Nestes momentos de crise econômica, nós mulheres estamos sofrendo os efeitos dos cortes sociais mais profundos em muitos anos. A reforma trabalhista, a reforma da Previdência e os cortes nos orçamentos dos serviços sociais (saúde, educação, etc.) afetam duplamente a mulher, que já está em uma posição de precariedade em relação a do homem. Encarregadas dos cuidados das crianças e anciãos e obrigadas a trabalhar por menos salário, as mulheres sofrem uma dupla cadeia dentro do sistema capitalista: a exploração e a opressão.

Mas nós também temos aparecido, ao longo da história, a frente das lutas sociais e democráticas. O dia 8 de março é um dia de visibilidade da luta pela libertação das mulheres. Mas cada dia, de maneira “invisível”, nós lutamos para conseguir nossa emancipação. Seja dentro dos sindicatos ou grupos políticos, seja dentro dos coletivos feministas ou com a luta diária de trabalhar e chegar ao fim do mês, temos um papel ativo essencial na transformação social.

Nas últimas semanas temos visto em repetidas ocasiões imagens de mulheres durante as revoluções árabes: Tunísia, Egito, Argélia, etc. Na primeira frente de batalha, na Praça Tahir ou na Praça Primeiro de Maio, as mulheres compareceram em massa aos protestos para derrubar os regimes autoritários que têm dominado seus países nas últimas décadas. Elas são destes países que o mundo ocidental quer invadir para libertá-las. Mas não se cansam de dizer que só serão libertadas por elas mesmas.

Ainda que haja infinitos exemplos nos quais as mulheres lutaram nas revoluções democráticas e sociais, sua imagem é sempre silenciada e sua história eliminada, a serviço do pensamento sexista e de um sistema econômico que necessita deixar as mulheres em um segundo plano. Ainda assim, ao longo da história, as mulheres se levantaram uma e outra vez para gritar que elas não são o segundo sexo.

Isso aconteceu na Revolução Russa de 1917, quando milhares de mulheres participaram na luta pela liberdade e o socialismo. Os avanços nos direitos foram rápidos e os mais avançados da época: direito ao divórcio, anticonceptivos, salário igual, socialização dos cuidados, etc. Ainda que a experiência tenha sido curta devido ao isolamento da revolução e à contrarrevolução levada a cabo pela burocracia stalinista, a experiência criou um precedente.

O tema já clássico “sem as mulheres não haverá revolução” foi se repetindo em diferentes ocasiões nas quais a luta pelos direitos sociais da classe trabalhadora andou de mãos dadas com a luta pela libertação da mulher. Durante a II República, as mulheres também conseguiram uma série de direitos que situavam a democracia do Estado espanhol como uma das mais inclusivas da época. E, durante a Revolução Espanhola, as mulheres tiveram um papel chave na conquista dos direitos sociais.

Nos momentos nos quais os povos se levantaram contra a tirania e o capitalismo, nós temos sido protagonistas dos movimentos de emancipação. No entanto, em nossa sociedade segue dominando a imagem da mulher passiva. Quantas revoluções mais faltam para eliminar este estereótipo?

Agora, com as revoluções árabes, volta à tona a participação das mulheres nas revoluções. Nós também queremos igualdade, liberdade e não temos medo. Durante uma revolta social nossa participação é fundamental para que os avanços não fiquem só no plano formal e para que haja um questionamento profundo dos papeis atribuídos às mulheres e uma ruptura dos mesmos. Contamos com vários exemplos históricos nos quais temos visto que, quando as mulheres participam nas revoluções, a luta lado a lado com nossos companheiros de classe faz crescer a consciência. Mas esse não é um processo automático. Por esta razão, nossa participação nas revoltas é fundamental para conseguir nossa libertação.

Recentemente, temos visto também como milhões de mulheres saíram às ruas na Itália para protestar contra a cultura machista promovida por Berlusconi. “Se não é agora, quando será?”, gritavam as companheiras italianas. Aqui, no Estado espanhol, também temos milhares de razões para sair às ruas. Cada ataque do governo aos direitos conquistados pela classe trabalhadora é um ataque a nossos direitos como mulheres. E se a isso somamos o genocídio contra as mulheres pela violência machista, a pergunta das companheiras italianas é nossa também. Neste 8 de março, sairemos todas à rua para lutar, mas no dia seguinte não voltaremos para casa.

(*) Angie Gago é militante de Em Luta (Espanha)
Tradução: Katarina Peixoto

quinta-feira, 10 de março de 2011

UE abre debate para impor cotas de mulheres nas empresas

Publicado originalmente no UOL Notícias , em 10/03/2011

El Pais - María R. Sahuquillo, Em Estrasburgo (França)

O telhado das grandes empresas europeias é feito de um vidro muito duro. Só 3% são dirigidas por mulheres. E elas representam apenas 12% dos membros dos conselhos administrativos. Um panorama desolador que a UE quer corrigir. A Comissão Europeia deu na terça-feira - Dia Internacional da Mulher - um ultimato ao setor privado para que corrija essas desigualdades. As empresas têm um ano para incorporar mais mulheres em postos de responsabilidade. Se não o fizerem, serão introduzidas medidas efetivas - cotas, ameaçou a vice-presidente da comissão, Viviane Reding, do Partido Popular Europeu.

Uma medida muito polêmica na qual também aposta o Parlamento Europeu, que aprovou na terça-feira um relatório no qual insta os países membros a adotar medidas efetivas, "como cotas", para avançar em direção à igualdade. Especialmente as empresas que têm participação pública. O relatório, que não é compulsório mas que será enviado como proposta de ação aos 27 Estados, afirma que esses mecanismos de regulamentação "têm efeitos positivos na representação das mulheres".

Para ilustrar o exemplo, o Europarlamento põe o foco sobre a Noruega - que não faz parte da UE -, país que aprovou em 2003 uma lei de paridade de gêneros (não menos de 40% para nenhum deles) nas cúpulas diretoras das empresas (primeiro em companhias públicas e depois nas privadas), e que conseguiu aumentar a representação feminina de 22% em 2004 para 42% em 2009. Se não cumprirem, essas empresas se arriscam a duras sanções, inclusive a dissolução da companhia.

O debate está muito vivo em toda a Europa. Na França se decidiu dar seis anos para que suas grandes empresas (mais de 500 funcionários ou com receitas superiores a 50 milhões de euros) se adaptem a uma nova lei que impõe uma cota feminina de pelo menos 40% nos conselhos administrativos. Terão de melhorar muito seus números: atualmente só cinco empresas das 40 maiores da França superam 20% de conselheiras. Uma medida semelhante à apresentada na Bélgica, onde se discute uma cota feminina de um terço do total. Na Espanha, onde esses órgãos só têm 10% de mulheres, a lei também prevê a necessidade de que sua composição seja equilibrada, mas se limita a uma recomendação.

Mas nem todos são a favor de uma política de cotas. Na Alemanha, por exemplo, a chanceler Angela Merkel se pronunciou contra essa medida, que também não seduz no Reino Unido. A grega Rodi Kratsa-Tsagaropoulou (Partido Popular Europeu), vice-presidente da Eurocâmara, não crê que as cotas sejam a solução. "Precisamos de uma política de apoio para a mulher na empresa e de um processo de supervisão para a seleção de pessoal, sobretudo em nível de diretoria, isso sim seria eficaz", diz. E vai além: "As mulheres devem estar representadas horizontalmente, não só na direção. É a única maneira de que cheguem ao topo".

A búlgara Maria Nedelcheva (PPE), proponente do relatório aprovado na terça-feira no Parlamento Europeu, também vê nas cotas o caminho. Aposta que as empresas estabeleçam códigos de boas práticas, uma medida que já foi tomada na Suécia, Finlândia, Holanda e Dinamarca. Nedelcheva, no entanto, apoia a proposta da Comissão. "Se com a autorregulamentação não se chegar a nada, é preciso fazer algo. As cifras atuais são intoleráveis", diz.

E é isso que por enquanto vai fazer a Comissão, que dá uma oportunidade às empresas - já se reuniram com grandes firmas como Basf, Dexia ou Guerlain - para que estabeleçam mecanismos para promover a participação das mulheres nos cargos de responsabilidade. "A situação atual é intolerável. A falta de representação feminina em cargos de direção é um desperdício de recursos que só pode prejudicar nossa economia, para não falar que é uma gravíssima discriminação", declarou na terça-feira o presidente José Manuel Durão Barroso.

A Comissão propõe às empresas fórmulas como contratar mais mulheres qualificadas para substituir os aposentados. "Se não fizermos algo, se continuarmos nesse ritmo, não alcançaremos a igualdade dentro de 50 anos. Não podemos continuar assim", disse Reding. Durante esse ano de tolerância, a Comissão vai supervisionar o comportamento e os resultados das empresas. No entanto, nem Barroso nem Reding esclareceram que ações serão realizadas se as empresas não adotarem códigos de boas práticas, nem que medidas tomarão para impor as cotas se a autorregulamentação não for satisfatória.

Melhor com formação do que com leis

O estabelecimento da fórmula de cotas por lei não agrada aos cidadãos. Apesar de que 75% acreditam que é nas empresas que se dão maiores situações de desigualdade entre homens e mulheres, só 19% dos europeus mostram-se partidários de que haja por lei um mínimo de participação feminina nas companhias.

São os dados de um Eurobarômetro especial divulgado na terça-feira no Parlamento Europeu em Estrasburgo, que mostra a opinião de mais de 26 mil cidadãos da UE. A maior parte (44%) acredita que para conseguir a igualdade efetiva seria melhor que as empresas se autorregulassem e 30% consideram que para conseguir o equilíbrio é melhor que sejam instauradas medidas de apoio e formação. As sanções para as empresas que não tenham uma representação equilibrada em suas cúpulas diretoras tampouco têm grandes apoios. Só 15% dos homens e 19% das mulheres estão de acordo.

Para 44% dos europeus, a baixa representação das mulheres na política se deve ao fato de que é um mundo dominado pelos homens que não valorizam as competências delas. Entretanto, só 25% apoiam a paridade nas listas eleitorais.

Atualmente as mulheres europeias ganham em média 17% a menos que os homens. No entanto, só 22% deles e 27% delas se mostram partidários de sancionar as empresas que não respeitam a igualdade salarial.

A cota feminina na Europa

Noruega. Uma lei de 2003 impõe que as empresas tenham pelo menos 40% de representação feminina em seus conselhos administrativos. No entanto, em 2005 a participação feminina nas companhias privadas não havia alcançado 14%.

França. Também vai impor uma cota feminina de pelo menos 40% nos conselhos administrativos das empresas com mais de 500 empregados. Elas têm seis anos para se adaptar.

Espanha. A lei de igualdade apela a que as empresas tenham uma participação equilibrada nos conselhos administrativos. A medida é uma simples recomendação.

Bélgica. Um projeto de lei prevê que um terço dos membros dos conselhos administrativos sejam mulheres.

Alemanha. As empresas têm códigos de boas práticas para fomentar a igualdade, e também se discutiu sobre as cotas. Angela Merkel se mostrou contra a medida.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

As mulheres não são homens

A cultura patriarcal tem uma dimensão particularmente perversa: a de criar a ideia na opinião pública que as mulheres são oprimidas e, como tal, vítimas indefesas e silenciosas. Este estereótipo torna possível ignorar ou desvalorizar as lutas de resistência e a capacidade de inovação política das mulheres.

Por Boaventura de Sousa Santos* na Agência Carta Maior , em 09/03/2011


No passado dia 8 de março celebrou-se o Dia Internacional da Mulher. Os dias ou anos internacionais não são, em geral, celebrações. São, pelo contrário, modos de assinalar que há pouco para celebrar e muito para denunciar e transformar. Não há natureza humana assexuada; há homens e mulheres. Falar de natureza humana sem falar na diferença sexual é ocultar que a “metade” das mulheres vale menos que a dos homens. Sob formas que variam consoante o tempo e o lugar, as mulheres têm sido consideradas como seres cuja humanidade é problemática (mais perigosa ou menos capaz) quando comparada com a dos homens. À dominação sexual que este preconceito gera chamamos patriarcado e ao senso comum que o alimenta e reproduz, cultura patriarcal.

A persistência histórica desta cultura é tão forte que mesmo nas regiões do mundo em que ela foi oficialmente superada pela consagração constitucional da igualdade sexual, as práticas quotidianas das instituições e das relações sociais continuam a reproduzir o preconceito e a desigualdade. Ser feminista hoje significa reconhecer que tal discriminação existe e é injusta e desejar activamente que ela seja eliminada. Nas actuais condições históricas, falar de natureza humana como se ela fosse sexualmente indiferente, seja no plano filosófico seja no plano político, é pactuar com o patriarcado.

A cultura patriarcal vem de longe e atravessa tanto a cultura ocidental como as culturas africanas, indígenas e islâmicas. Para Aristóteles, a mulher é um homem mutilado e para São Tomás de Aquino, sendo o homem o elemento activo da procriação, o nascimento de uma mulher é sinal da debilidade do procriador. Esta cultura, ancorada por vezes em textos sagrados (Bíblia e Corão), tem estado sempre ao serviço da economia política dominante que, nos tempos modernos, tem sido o capitalismo e o colonialismo. Em Three Guineas (1938), em resposta a um pedido de apoio financeiro para o esforço de guerra, Virginia Woolf recusa, lembrando a secundarização das mulheres na nação, e afirma provocatoriamente: “Como mulher, não tenho país. Como mulher, não quero ter país. Como mulher, o meu país é o mundo inteiro”.

Durante a ditadura portuguesa, as Novas Cartas Portuguesas publicadas em 1972 por Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, denunciavam o patriarcado como parte da estrutura fascista que sustentava a guerra colonial em África. “Angola é nossa” era o correlato de ”as mulheres são nossas (de nós, homens)” e no sexo delas se defendia a honra deles. O livro foi imediatamente apreendido porque justamente percebido como um libelo contra a guerra colonial e as autoras só não foram julgadas porque entretanto ocorreu a Revolução dos Cravos em 25 de Abril de 1974.

A violência que a opressão sexual implica ocorre sob duas formas, hardcore e softcore. A versão hardcore é o catálogo da vergonha e do horror do mundo. Em Portugal, morreram 43 mulheres em 2010, vítimas de violência doméstica. Na Cidade Juarez (México) foram assassinadas nos últimos anos 427 mulheres, todas jovens e pobres, trabalhadoras nas fábricas do capitalismo selvagem, as maquiladoras, um crime organizado hoje conhecido por femicídio. Em vários países de África, continua a praticar-se a mutilação genital. Na Arábia Saudita, até há pouco, as mulheres nem sequer tinham certificado de nascimento. No Irão, a vida de uma mulher vale metade da do homem num acidente de viação; em tribunal, o testemunho de um homem vale tanto quanto o de duas mulheres; a mulher pode ser apedrejada até à morte em caso de adultério, prática, aliás, proibida na maioria dos países de cultura islâmica.

A versão softcore é insidiosa e silenciosa e ocorre no seio das famílias, instituições e comunidades, não porque as mulheres sejam inferiores mas, pelo contrário, porque são consideradas superiores no seu espírito de abnegação e na sua disponibilidade para ajudar em tempos difíceis. Porque é uma disposição natural. não há sequer que lhes perguntar se aceitam os encargos ou sob que condições. Em Portugal, por exemplo, os cortes nas despesas sociais do Estado actualmente em curso vitimizam em particular as mulheres. As mulheres são as principais provedoras do cuidado a dependentes (crianças, velhos, doentes, pessoas com deficiência). Se, com o encerramento dos hospitais psiquiátricos, os doentes mentais são devolvidos às famílias, o cuidado fica a cargo das mulheres. A impossibilidade de conciliar o trabalho remunerado com o trabalho doméstico faz com que Portugal tenha um dos valores mais baixos de fecundidade do mundo. Cuidar dos vivos torna-se incompatível com desejar mais vivos.

Mas a cultura patriarcal tem, em certos contextos, uma outra dimensão particularmente perversa: a de criar a ideia na opinião pública que as mulheres são oprimidas e, como tal, vítimas indefesas e silenciosas.

Este estereótipo torna possível ignorar ou desvalorizar as lutas de resistência e a capacidade de inovação política das mulheres. É assim que se ignora o papel fundamental das mulheres na revolução do Egipto ou na luta contra a pilhagem da terra na Índia; a acção política das mulheres que lideram os municípios em tantas pequenas cidades africanas e a sua luta contra o machismo dos lideres partidários que bloqueiam o acesso das mulheres ao poder político nacional; a luta incessante e cheia de riscos pela punição dos criminosos levada a cabo pelas mães das jovens assassinadas em Cidade Juarez; as conquistas das mulheres indígenas e islâmicas na luta pela igualdade e pelo respeito da diferença, transformando por dentro as culturas a que pertencem; as práticas inovadoras de defesa da agricultura familiar e das sementes tradicionais das mulheres do Quénia e de tantos outros países de África; a resposta das mulheres palestinianas quando perguntadas por auto-convencidas feministas europeias sobre o uso de contraceptivos: “na Palestina, ter filhos é lutar contra a limpeza étnica que Israel impõe ao nosso povo”.


*Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).

quarta-feira, 9 de março de 2011

Mulheres na Revolução Egipcia

Site com uma maravilhosa seleção de fotos da participação das mulheres na revolução egipcia.